
O presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), José Roberto Tadros, acendeu um alerta sobre um problema que assola boa parte do empresariado brasileiro: está cada vez mais difícil contratar mão de obra.
Segundo Tadros, muitas pessoas simplesmente deixaram de buscar emprego, vivendo sob o amparo de programas sociais como o Bolsa Família. “As pessoas estão sob a égide do Bolsa Família”, afirmou, durante o Fórum do Comércio 2025, realizado em Salvador. A declaração não é isolada e reflete o incômodo de quem precisa contratar, mas encontra um cenário em que a oferta de trabalhadores é escassa, mesmo com milhões de brasileiros em idade ativa.
Cerca de 20,8 milhões de famílias, o equivalente a 55 milhões de pessoas, recebem o Bolsa Família, de acordo com dados do próprio governo. Se considerados outros programas sociais como Benefício de Prestação Continuada (BPC), Auxílio Gás e outros auxílios complementares, o número de cidadãos que dependem direta ou indiretamente de repasses públicos ultrapassa 60 milhões de brasileiros. Em contrapartida, o número de pessoas ocupadas no país, segundo o IBGE, gira em torno de 104 milhões. Ou seja, para cada dois trabalhadores ativos, há um beneficiário de programa social.
A equação preocupa o setor produtivo. Afinal, se a base que gera riqueza e paga impostos encolhe enquanto cresce a fatia da população dependente de transferências, o equilíbrio fiscal e social se torna insustentável. A crítica do empresariado é clara: o país estaria formando uma geração que se acostuma à dependência, sem qualificação nem perspectiva de trabalho. Tadros defende que o Bolsa Família deva ser uma porta de entrada, mas também precisa ter uma “porta de saída”, para evitar a criação de uma casta permanente de assistidos.
A maquiagem
Há outro lado dessa história, o da “queda” do desemprego. O governo comemora, com pompa, a taxa oficial de menos de 6% divulgada pelo IBGE. Aparentemente, o Brasil vive um milagre: quase pleno emprego, recorde de carteiras assinadas e economia em recuperação. Só que o otimismo estatístico não resiste a uma análise mais detalhada. A mágica está na metodologia. É uma maquiagem estatística. Um engodo.
A taxa de desemprego mede apenas quem procura trabalho e não encontra. Quem desistiu de procurar, seja por desânimo, por viver de bicos, ou porque sobrevive com auxílios públicos, não entra na conta. É o que os economistas chamam de “população fora da força de trabalho”. Esse grupo vem crescendo silenciosamente. São milhões de brasileiros em idade produtiva que simplesmente desapareceram das estatísticas, não porque conseguiram um emprego, mas porque deixaram de procurar um. Isso significa que a taxa de desemprego pode cair mesmo que o número de pessoas efetivamente trabalhando não aumente.

Outro fator que mascara a realidade é a informalidade. Cerca de 39% dos trabalhadores brasileiros estão no mercado informal, segundo o próprio IBGE. São vendedores ambulantes, diaristas, entregadores e autônomos que vivem de rendas irregulares, sem carteira assinada nem contribuição previdenciária. Ainda assim, são contabilizados como “ocupados”. O resultado é um indicador de desemprego artificialmente otimista: o país parece empregar mais, quando na verdade não emprega.
A confusão entre “ter trabalho” e “ter renda estável” ajuda a sustentar o discurso oficial de que o Brasil vive uma fase de prosperidade. No entanto, boa parte da população sobrevive em ocupações precárias, com rendimentos insuficientes para cobrir despesas básicas. O próprio IBGE aponta que o rendimento médio do trabalho caiu, em termos reais, ao longo do último ano. Isso indica que há mais pessoas trabalhando, mas ganhando menos.
A dependência
Enquanto isso, a dependência de programas sociais se consolida. O Bolsa Família, que nasceu como política emergencial para combater a pobreza, tornou-se uma estrutura permanente, incorporada à base orçamentária do país. O problema não é o auxílio em si, mas o fato de que ele se transformou, para milhões, na única fonte de renda, virou um meio de vida cômodo. Ao mesmo tempo, o programa serve como ferramenta política e narrativa: quanto mais beneficiários, maior o alcance do discurso de “proteção social”.
Em resumo, o Brasil vive um paradoxo. De um lado, o governo divulga recordes de emprego e comemora estatísticas positivas. De outro, empresários não conseguem preencher vagas e alertam para o desinteresse crescente pelo trabalho formal. A economia parece saudável no papel, mas carrega sintomas de uma doença estrutural: a substituição do incentivo ao trabalho pelo conforto do benefício social. A maquiagem dos números esconde a realidade de um país que produz menos, gasta mais e se acomoda em uma sensação de estabilidade estatística.
Se a força de trabalho se retrai e a dependência de programas sociais aumenta, quem sustentará o sistema? A matemática é implacável, e a retórica otimista, por si só, não gera riqueza. O país caminha para a beira do abismo, ou já está nela.


