RAY CUNHA
À medida em que os recursos naturais do planeta vão se esgotando, o meio ambiente é agredido, as pandemias se tornam mais frequentes e as guerras provocam mortandade, seja por armas biológicas ou bombas, cada vez mais as potências hegemônicas se voltam para a Amazônia. Atualmente, com o avanço do comunismo na América do Sul, principalmente no Brasil, a China finca os pés, cada vez mais fundo, na Hileia, agora a convite do próprio presidente da República, Lula da Silva, diante do olhar chocado dos Estados Unidos.
Além de declarar para a imprensa internacional que os Estados Unidos são culpados pela situação da Venezuela, que de país mais rico da América do Sul passou a ser o mais miserável, sob o comando de Nicolás Maduro, ditador tão sanguinário quanto Fidel Castro, Lula o recebeu, este mês, em Brasília, com honras de Estado, apesar de os Estados Unidos oferecerem 15 milhões de dólares pela cabeça de Maduro, acusado de narcotráfico. De quebra, Lula recebeu ainda vários oficiais do Exército chinês.
O Estado comunista chinês, um dos mais fechados e brutais do planeta, vem travando a atual guerra fria contra os Estados Unidos e vem fechando cada vez mais suas garras na América do Sul, especialmente no Brasil e principalmente na Amazônia. Agora que Lula tenta concretizar o plano do Foro de São Paulo de criar a União das Repúblicas Socialistas da América do Sul, a sonhada pelos comunistas URSS do Trópico, os chineses estão assanhados, e os Estados Unidos estranhamente quietos.
Mas por que a Amazônia? A região tem 6,7 milhões de quilômetros quadrados, 60% dos quais no Brasil. Dezesseis por cento da água doce que chega aos oceanos são da Amazônia, especialmente do rio Amazonas, o maior do mundo, despejando em média 200 mil metros cúbicos de água por segundo no Atlântico. Trata-se da maior floresta tropical do planeta e produz rios aéreos. E mais: o rio Hamza, a quatro mil metros sob a superfície da bacia do rio Solimões-Amazonas, desagua também no Atlântico, abaixo da foz do rio Amazonas, com vazão de 3.090 metros cúbicos por segundo.
A Amazônia é a maior reserva de biodiversidade e a maior província mineral do planeta. Tem cerca de 2.400 espécies de peixes, enquanto que o litoral brasileiro tem metade disso. Guarda mais ouro do que o lastro dos Estados Unidos e tem a maior reserva de diamante do mundo. E tem petróleo, bastante, ao largo do Amapá e Pará.
A França já tem seu naco da América do Sul, a Guiana Francesa. Inglaterra, Alemanha, União Europeia, Japão e Estados Unidos entram na Amazônia por meio de ongs e do mercado internacional de minérios. A China, como já se disse, está entrando à luz do dia, além de vir comprando terras há muito tempo.
Aqui e ali, líderes dessas potências dão com a língua nos dentes, vomitando que a Amazônia brasileira é de quem tiver poder de fogo para tomar a região. Até agora, só portugueses e brasileiros asseguraram essa posse. Mas, desde o Foro de São Paulo, ongs ambientalistas estrangeiras se multiplicam na região, agora com apoio de Lula, ameaçando a soberania brasileira sobre a floresta. Já houve projeto de os gringos pegaram todos os negros americanos e os jogarem na Amazônia; houve o Bolivian Syndicate; o Instituto Internacional da Hileia Amazônica; o Projeto Grandes Lagos do Hudson Institute etc.
Al Gore disse, em 1989: “Ao contrário do que os brasileiros pensam, a Amazônia não é deles, mas de todos nós”.
François Mitterrand, em 1989: “O Brasil precisa aceitar uma soberania relativa sobre a Amazônia”.
Mikhail Gorbachev, em 1992: “O Brasil deve delegar parte de seus direitos sobre a Amazônia aos organismos internacionais competentes”.
John Major, em 1992: “As nações desenvolvidas devem estender o domínio da lei ao que é comum de todos no mundo. As campanhas ecológicas internacionais que visam à limitação das soberanias nacionais sobre a região amazônica estão deixando a fase propagandística para dar início a uma fase operativa, que pode, definitivamente, ensejar intervenções militares diretas sobre a região”.
Henry Kissinger, em 1994: “Os países industrializados não poderão viver da maneira como existiram até hoje se não tiverem à sua disposição os recursos naturais não renováveis do planeta. Terão que montar um sistema de pressões e constrangimentos garantidores da consecução de seus intentos”.
Emmanuel Macron, em 2019: “Associações, ONGs e atores, já há vários anos – por vezes alguns atores jurídicos internacionais – levantaram a questão para saber se podemos definir um status internacional da Amazônia”.
Joe Biden, em 2020: Disse que assim que tomasse posse na Casa Branca “começaria imediatamente a organizar o hemisfério e o mundo para prover 20 bilhões de dólares para a Amazônia, para o Brasil não queimar mais a Amazônia”. E ameaçou, imaginando o que a comunidade internacional diria ao Brasil: “Aqui estão 20 bilhões de dólares, pare de destruir a floresta. E se não parar, vai enfrentar consequências econômicas significativas”.
O que fazer para mostrar, inequivocamente, ao planeta que a Amazônia é brasileira? Ocupá-la, de fato! Em 25 de fevereiro de 2005, entrevistei o coronel do Exército, Gelio Fregapani, mentor da Doutrina Brasileira de Guerra na Selva. Fregapani pulveriza qualquer romantismo sobre a Hileia, e não descarta guerra pela ocupação do Trópico Úmido. “A Amazônia será ocupada. Por nós ou por outros” – adverte.
Fregapani já esteve em praticamente todos os locais habitados e muitos dos desabitados da Amazônia, inclusive trechos da selva que poucos conhecem e que nem uma hecatombe nuclear destruiria, devido à sua exuberância e umidade, e fala também mais de uma língua indígena. Conduziu geólogos a lugares ínvios, chefiou expedições militares e coordenou expedições científicas às serras do extremo norte, onde dormem as maiores jazidas minerais da Terra, e desenvolveu métodos profiláticos para evitar doenças tropicais, tendo saneado as minas do Pitinga e a região da hidrelétrica de Cachoeira Porteira. Serviu ao Exército durante quatro décadas, quase sempre ligado à Amazônia, tendo fundado e comandado o Centro de Instrução de Guerra na Selva. Vem observando a atuação estrangeira na Amazônia há cinco décadas, o que o levou a escrever Amazônia – A grande cobiça internacional (Thesaurus Editora, Brasília, 2000, 166 páginas).
Essa experiência lhe dá legitimidade para afirmar que o problema crucial da Amazônia é que ela ainda não foi devidamente ocupada pelos brasileiros. Por isso, ledo engano é supor que a região pertence de fato ao Brasil. Será, sim, do Brasil, quando for desenvolvida por nós e devidamente guardada. Daí porque às potências estrangeiras não interessa o desenvolvimento da Amazônia. Aos Estados Unidos, Inglaterra, Japão e China, principalmente, interessa manter os cartéis agrícolas e de minerais e metais. Dois exemplos: a soja da fronteira agrícola ameaça a soja americana; e a exploração dos fabulosos veios auríferos da Amazônia poriam em xeque as reservas similares americanas e poderia mergulhar ainda mais o gigante em recessão.
Assim, despovoada, sub explorada e subdesenvolvida, não há grandes problemas para a ocupação estrangeira da região. Por exemplo: a reserva Ianomâmi – etnia que seria forjada pelos ingleses –, do tamanho de Portugal e na tríplice fronteira, em litígio, Brasil, Venezuela e Guiana, é a maior e mais rica província mineral do planeta. Pois bem, já há manifestação na Organização das Nações Unidas (ONU) de torná-la nação independente do Brasil.
Qual é a maneira legítima de ocupação da Amazônia? Perguntei a ele.
– A Amazônia será ocupada. Por nós, ou por outros. Numa humanidade em expansão, com uma série de terras superpovoadas, uma terra despovoada e habitável, ela será ocupada. Por quem? Nós temos, legitimamente, a posse, mas essa legitimidade não nos garante o futuro. Se nós não ocuparmos a Amazônia, alguém a ocupará. Se nós não a utilizarmos, alguém vai utilizá-la. Portanto a questão é: devemos ocupá-la, ou não? Nós somos brasileiros, então devemos ocupá-la. Se nós nos achamos cidadãos do mundo, então podemos permitir a ocupação por outros. Como ocupar? Essa história de Amazônia Legal é uma falácia, feita para incluir nos benefícios da Amazônia algo que não tem nada a ver com a Amazônia real, que é aquela selva que nós todos conhecemos. A periferia da selva será ocupada, fatalmente, pela agricultura, até para alimentar o mundo. Os madeireiros não fazem o mal à selva que os ambientalistas falam. Os madeireiros pegam espécies selecionadas, que interessam ao mercado. É claro que eles abrem picadas para chegar até essas árvores, mas isso não faz dano à floresta, porque há milhões de pequenas árvores, chamadas de filhotes, que estão lá, há muitos anos, esperando uma chance de chegar ao sol para poder crescer. Quando uma árvore é abatida, aqueles filhotes que estão em redor crescem numa velocidade espantosa, na disputa para ver qual dos indivíduos vai substituir a árvore que foi abatida. Isso não altera em nada a floresta. Mas a fronteira pioneira vai avançando. Nessas trilhas, irão colonos, que procurarão fazer um corte para colocar o gado. Isso faz com que o Brasil tenha o maior rebanho de gado fora da Índia, e que abastece o mundo de carne. Há quem ache ruim. Há quem queira as árvores e não o gado. Depois, pela valorização, essas terras serão usadas pela agricultura. Essa é a forma natural de ocupação, embora lenta, pois precisamos ocupar a Amazônia de uma forma mais veloz. Contudo, tanto o gado como a agricultura, não poderão ficar na área de floresta mesmo. Não porque os ambientalistas querem. É porque a floresta não deixa. Na floresta, fora dessa área de transição, de periferia, na floresta úmida, real, as árvores crescem com uma rapidez incrível. Primeiro vem uma árvore pioneira, a imbaúba, e sob a sombra da imbaúba cresce a verdadeira floresta. Em dois anos, as imbaúbas já estão com mais de 40 metros. Então, não é possível uma agricultura, como nós a concebemos no Sul, ou no Hemisfério Norte, porque a floresta não deixa. O correto seria a silvicultura, ou seja, a substituição de árvores por outras árvores. Muitas outras árvores são interessantes para substituir aquelas árvores de menos valor, como a castanheira, a seringueira, mas, no momento, o que chama atenção, mesmo, é o dendê.
Dendê?
– As reservas de petróleo estão diminuindo no mundo e o consumo está aumentando. Vai chegar um momento que o uso de petróleo será inviável. Eu não estou dizendo que o petróleo vai acabar. Sempre vai sobrar um pouco, ou um achado novo, mais fundo, mas o uso do petróleo, como se faz atualmente, está com seus dias contados. Além do mais, os Estados Unidos estão procurando tomar conta de todas as jazidas que existem no mundo e alguns países estão realmente preocupados com isso. A Alemanha, que já sabe muito bem o que é falta de energia, está plantando canola para substituir diesel, e já tem alguns milhares de postos fornecendo biodiesel aos consumidores. A canola produz por hectare 20 vezes menos do que o dendê, que precisa só de calor, sol e água. Exatamente o que abunda na Amazônia. O mundo tem fome de biodiesel.
Há possibilidade de guerra pela ocupação da Amazônia?
– Sabemos que haverá pressões, sabemos que outros tentarão ocupar a Amazônia, sabemos que se nós não a ocuparmos, certamente teremos uma guerra pela ocupação. E guerra que ninguém garante que nós vamos vencer. A necessidade de ocupação da Amazônia é um fato e a melhor forma é deixar prosseguir a fronteira agrícola. E quanto mais perto das serras que separam o Brasil dos países ao norte, melhor. É nítido o desejo dos povos desenvolvidos tomarem conta das serras que separam o Brasil da Venezuela e da Guiana, por dois motivos: para evitar que o Brasil concorra com seus mercados e como reserva futura de matéria-prima. Podemos substituir as árvores nativas pelo dendê e, com isso, conseguiremos tudo o que precisamos. Atenderia a 6 milhões de trabalhadores rurais e acabaria até com o problema dos sem-terra. Essa solução é tão vantajosa para o Brasil que para mim é incompreensível que isso não esteja com destaque na grande mídia, não esteja na discussão de todos os brasileiros.
A quem interessa a grita dos ambientalistas na Amazônia?
– Há três países especialmente interessados nisso: os Estados Unidos, a Inglaterra e a Holanda. Eles têm coadjuvantes: França, Alemanha e outros; até mesmo a Rússia já se meteu, no tempo de Gorbachev. Mas o interesse dos Estados Unidos é mais profundo. Se nós explorarmos o ouro abundante da Amazônia vai cair o preço do ouro, e isso vai diminuir o valor das reservas dos Estados Unidos, onde está certamente a maior parte do ouro governamental do mundo. Isso seria um baque para os Estados Unidos, talvez pior do que perderem o petróleo da Arábia Saudita. A Inglaterra, não é de hoje, sempre meteu o bedelho nessas coisas. A Holanda, que é o país que mais modificou seu meio ambiente, tendo retirado seu território do mar, também tem umas manias loucas em função do meio ambiente. A grita ambientalista atende principalmente aos Estados Unidos, para cortar a exploração do ouro e também para não atrapalhar seu mercado de soja. À Inglaterra interessa o estanho, mercado que sempre dominou. Uma só jazida de estanho na Amazônia, do Pitinga, quebrou o cartel do estanho, fazendo despencar o preço de US$ 15 mil a tonelada para menos de US$ 3 mil. Reconheço que há ambientalistas sinceros, que acreditam nessas falácias, nessas mentiras, ostensivas, como a de que a Amazônia é o pulmão do mundo e que os polos estão derretendo por causa disso e por causa daquilo. Os polos estão derretendo porque ciclicamente derretem e se alguma coisa influi nisso são os países industrializados.
A abertura de estradas na Amazônia é necessária?
– Quando foi aberta a Belém-Brasília, a Amazônia era como se estivesse noutro continente. Nós poderíamos chegar lá, sem dúvida, de navio ou de avião. A Belém-Brasília rasgou apenas 600 quilômetros de selva, mas essa área já está povoada, é definitivamente nossa. Tem conflitos, mas tem riquezas, tem um rebanho enorme e começa a produzir alimentos vegetais. A Transamazônica não teve o mesmo sucesso porque devia ter sido construída por etapas. A estrada especialmente estratégica, que garantiria para o Brasil a posse da Amazônia, que seria a Perimetral Norte, não saiu do papel. Mas somente estradas podem povoar a Amazônia. Elas terão que ser abertas.
Quais são os pontos específicos da Amazônia que interessam às potências estrangeiras?
– As serras que separam o Brasil da Venezuela e da Guiana, e um pouquinho da Colômbia. Lá é que estão as principais jazidas e minerais do mundo. É lá que eles forçam para a criação de nações indígenas e, quem sabe, vão forçar depois a separação dessas nações indígenas do Brasil. Um segundo ponto é a orla da floresta, essa transição da floresta para o cerrado, perfeitamente apta à agricultura. Isso entra em choque com os interesses agrícolas dos Estados Unidos. O interior real da floresta, esse é desabitado, desconhecido e é mais falado pelos ambientalistas sinceros, mas ignorantes, aqueles que julgam que a floresta tem que ser preservada na sua totalidade, mesmo que o povo brasileiro fique desempregado, faminto e submisso às potências, que construíram o seu progresso modificando o meio ambiente. Não há como haver progresso sem modificar o meio ambiente. Nós temos, às vezes, algumas falácias nisso. Os ambientalistas não querem que se construam barragens nem que se faça irrigação. Não existe desperdício maior do que o rio jogar água no mar. O ideal é que a água fosse usada toda aqui dentro.
É verdade que a população indígena foi reduzida drasticamente desde o descobrimento do Brasil?
– Mais de 30 milhões de brasileiros que se consideram brancos têm sangue indígena. Temos, portanto, mais de 30 milhões de descendentes de indígenas. Se considerarmos que havia 3 milhões de indígenas na chegada de Cabral e se há 30 milhões de seus descendentes entre os que se consideram brancos nós vemos que a população indígena não foi reduzida; foi ampliada. O que certamente acontecerá não é a eliminação do índio; é a eliminação de suas sociedades, por serem anacrônicas. A sociedade medieval já acabou. A sociedade dos samurais também. A sociedade dos mandarins também. Por que tem de ser mantida uma sociedade que não cabe no mundo moderno? Os valores tribais não são facilmente aceitos por pessoas evoluídas. Canibalismo pode ser aceito? Sinceramente, no meu entender, não. O assassinato de filhos, como cultura, não como delito, pode ser aceito? Isso não é compreensivo para mim. A nossa ingenuidade talvez nos leve a achar que devemos preservar a mata nativa e deixar o povo com fome.
Os ianomâmis são uma nação verdadeira ou forjada?
– Absolutamente forjada. São quatro grupos distintos, linguisticamente, etnicamente e, por vezes, hostis entre eles. A criação dos ianomâmis foi uma manobra muito bem conduzida pela WWF com a criação do Parque Ianomâmi para, certamente, criar uma nação que se separe do Brasil. O Parque Ianomâmi é uma região do tamanho de Portugal, ou de Santa Catarina, onde, segundo afirmação da Funai (Fundação Nacional do Índio) há 10 mil índios. A Força Aérea, que andou levando o pessoal para vacinação, viu que os índios não passam de 3 mil. Ainda que fossem 10 mil, há motivo para se deixar a área mais rica do país virtualmente interditada ao Brasil? O esforço deveria ser no sentido de integrá-los na comunidade nacional. Nenhuma epidemia vai deixar de atingir índios isolados. A única salvação, nesse caso, é a ciência médica. A área ianomâmi é imensa e riquíssima, está na fronteira e há outra área ianomâmi, similar, no lado da Venezuela. Então, está tudo pronto para a criação de uma nação. Um desses pretensos líderes, orientado naturalmente pelos falsos missionários americanos, Davi Ianomâmi, já andou pedindo na ONU uma nação, e a ONU andou fazendo uma declaração de que os índios podem ter a nação que quiserem. No discurso de Davi, ele teria dito que querem proteção contra os colonos brasileiros, que os querem exterminar.
Qual é a grande vocação da Amazônia?
– Duas. Uma é a mineração. E a outra é a silvicultura. Particularmente a silvicultura do dendê, que, certamente, vai suprir o mundo de combustível em substituição ao petróleo. Em menos de duas décadas, o biodiesel e o álcool terão substituído o diesel e o petróleo em quase todo o mundo. Lugar algum oferece melhores condições para essa produção do que a Amazônia.
E o turismo?
– É um pequeno paliativo. Não é suficiente para desenvolver a Amazônia. A Amazônia nunca será uma Suíça, uma Espanha.
A falta de ocupação da Amazônia é, então, o grande problema da região?
– É o grande problema do Brasil. A Amazônia será ocupada, de um jeito ou de outro. Por nós ou por outros. A solução da ocupação não é para a Amazônia, é para o nosso país, se quisermos ter a Amazônia.
O romance ensaístico JAMBU, desde repórter, será lançado com selo do Clube de Autores, em Macapá, durante os festejos dos 70 anos da Academia Amapaense de Letras (AAL), em 21 de junho. JAMBU é um mergulho na Hileia. A trama se desenrola durante o Festival de Gastronomia do Pará e Amapá, no monumental Hotel Caranã, no bairro do Pacoval, em Macapá, uma cidade mais emblemática da Amazônia, onde fica o maior forte colonial português, a Fortaleza de São José de Macapá, maior ícone dos macapaenses, pois é a tradução perfeita de Macapá. Construída por escravos – negros e índios –, debaixo do látego do colonizador português, foi o cadinho no qual se forjou a etnia macapaense.
Os portugueses cruzaram com africanos e geraram mulatos, e fornicaram com os índios, formando uma população de mamelucos; os africanos fundaram os bairros do Curiaú e do Laguinho, misturaram-se com os índios e legaram cafuzos; e mulatos, cafuzos e mamelucos misturaram-se, fechando o círculo, numa diversidade étnica viva nas ruas de Macapá, nas nuanças de peles que vão do alabastro ao ébano, passando pelo bronze e jambo maduro, unidos pelo sotaque caboco: a fusão do português falado em Lisboa, doces palavras tupis, línguas africanas, patoá das Guianas, tudo triturado em corruptela.
Nesse cadinho étnico, o jambu é a erva que melhor sintetiza a Amazônia. Os amazônidas, sedados pelo sol equatorial, que, apesar dos 100% de umidade relativa do ar, esturrica tudo, e acossados pela grande floresta, microrganismos, insetos e animais peçonhentos, agem como as papilas gustativas entorpecidas por espilantol, presente no jambu, principalmente na sua flor: anestesiados, baixam a cabeça e se entregam aos seus carrascos, especialmente os políticos, que, independentemente de serem da própria terra, ou de fora, são inclementes como os antigos ibéricos.
Os políticos se uniram a um tipo de empresário escravocrata e que adora dinheiro, e passaram a gerir a senzala sem paredes, ampliando a Fortaleza de São José de Macapá a ventre da besta. A Amazônia está sempre coalhada de colonos e aventureiros: tecnocratas de Brasília; paulistanos que compram 90% das toras de árvores griladas; americanos que nunca desistiram de colonizar o subcontinente; japoneses ávidos em ampliar seu arquipélago; chineses acossados pela própria superpopulação; os europeus de sempre, além dos políticos, especialmente os comunistas, disfarçados de fabianos, sequiosos em vender – e embolsar o dinheiro – até a última árvore, a última pedra preciosa, e todas as mulheres e crianças que puderem.
Nesse cenário, do suplício imposto pelos ibéricos, da morte decretada pelos microrganismos e o assalto e o desprezo perpetrado pelos políticos, os macapaenses se tornaram símbolo de um tempo antigo, persistente, de espanhóis e portugueses, colonos e colonizados, o drama que perpassa a Ibero-América, a tragédia da Amazônia, alicerçado pela crença de que os colonos são deuses e os colonizados, seres inferiores, que existem para servir aos sangues-azuis.
Para os colonos, a Amazônia só serve para três fins: construção de hidrelétricas; extração de madeira e mineral; e reserva de caça, pesca e escravos, especialmente para a triste realidade de crianças e mulheres, que, diferentemente do mito das amazonas, são criaturas fracas, subjugadas, escravas compradas à base de comida, de uma boneca, de uma balinha.
É julho, mês de férias de verão na Amazônia. Enquanto o Festival Gastronômico do Pará e Amapá revela ao mundo a cozinha mais saborosa do planeta, o oceanógrafo, arqueólogo, taxidermista e jornalista João do Bailique, editor da revista Trópico Úmido e que trabalha numa edição especial sobre a Hileia, juntamente com sua esposa, a chefe de cozinha e oceanógrafa Danielle Silvestre Castro, dona do Hotel Caranã, investiga também o tráfico de crianças e mulheres para escravidão sexual. Ambos estão à caça do traficante de crianças e de grude de gurijuba Jules Adolphe Lunier.
Nos salões do Hotel Caranã são servidos pratos da mais saborosa culinária do planeta: a paraense. Personagens de ficção misturam-se a personagens reais, vivas e mortas, como o pintor amapaense Olivar Cunha, que decora o cenário do Festival de Gastronomia do Pará e Amapá; o compositor paraense Waldemar Henrique; o filósofo japonês Masaharu Taniguchi; o escritor, astrofísico e médium Laércio Fonseca; o escritor, psicanalista e acupunturista Jorge Bessa; os jornalistas Walmir Botelho e Carlos Mendes; a cantora lírica Carmen Monarcha; a pianista Walkíria Ferreira Lima, cofundadora da Academia Amapaense de Letras, e seu filho, o poeta Isnard Brandão Lima Filho, também acadêmico.
Em JAMBU, a Amazônia fica literalmente nua. Todas as questões que vêm sendo discutidas em torno da grande floresta são dissecadas, inclusive à indagação cada vez mais frequente: a Amazônia é mesmo do Brasil?