Em Brasília-DF, um em cada quatro indivíduos consumiu abusivamente de bebidas alcoólicas no ano passado, conforme dados do boletim epidemiológico mais recente da Secretaria de Saúde (SES-DF) sobre o tema. O resultado corresponde ao período de 2019 a 2023 e posiciona a unidade da federação no segundo lugar do ranking de ingestão excessiva por habitantes das capitais do Brasil, atrás apenas de Salvador, com 28,9% ante os 25,7% da população brasiliense.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que a dependência em drogas lícitas ou ilícitas é uma doença. O uso indevido de substâncias como álcool, cigarro, crack e cocaína é um problema de saúde pública e também um fator de risco associado às doenças e agravos não transmissíveis, que englobam acidentes e violência – as principais causas de morbimortalidade em todo o mundo.
Vinte de fevereiro é marcado como o Dia Nacional de Combate às Drogas e ao Alcoolismo, oportunidade em que é lançado um olhar para as ações capazes de minimizar o consumo e prevenir as doenças e os agravos não transmissíveis.
Alcoolismo
Estima-se que o álcool seja responsável por mais de três milhões de mortes por ano em todo o mundo, correspondente a 5,3% do total de óbitos – uma dentre 20 ocorrências fatais, de acordo com a OMS. Em Brasília, de 2016 a 2021, ocorreram 3.227 mortes por causas plenamente atribuíveis ao álcool, alcançando a taxa de 23,9 óbitos por cem mil habitantes no último ano. As fatalidades são predominantes no sexo masculino – 91% das mortes em 2021.
Estudos destacam a relevância dos fatores genéticos na transmissão da vulnerabilidade às dependências. Nesses casos, o desenvolvimento do transtorno é resultado da associação de condições biológicas hereditárias a situações ambientais ao longo da vida.
A enfermeira Angelita Bandeira, integrante da equipe do Centro de Atenção Psicossocial para tratamento de Álcool e outras Drogas (Caps AD) II de Santa Maria – Flor de Lótus, destaca que qualquer pessoa está suscetível à dependência química. “Em muitas situações, a diferença está em ser exposto ou não à tal substância”, afirma.
Tadeu da Silva, 51, percorre os espaços do Caps AD II de Santa Maria com desenvoltura. Vestido com calça e camisa social coberta por uma jaqueta de veludo estava pronto para ir ao cinema “com a turma”. Ele acabava de sair da reunião do grupo Análise – destinado à partilha e reflexões sobre as experiências pessoais dos integrantes. “Hoje estou aqui ‘arrumadinho’, mas não cheguei ao centro assim”, declara.
Antes de ingressar no Caps Flor de Lótus, em fevereiro de 2022, inúmeras foram as tentativas de enfrentar a dependência do álcool. Percebendo os resultados alcançados por si e pelos colegas, o morador de Santa Maria buscou se dedicar totalmente ao tratamento neste ano. Frequentador da unidade de saúde por até quatro vezes na semana, faz questão de frisar: “O tratamento é a longo prazo. Não posso dizer que é como um passe de mágica, que você ficará bom de um dia para o outro. Essa doença não tem cura. Não existe um remédio para a dependência química. O importante é a constância.”
Diante das dificuldades, encontrou no serviço especializado de saúde mental da Secretaria de Saúde (SES-DF) o suporte fundamental para as suas conquistas. “Eu disse em uma reunião para toda a equipe que eles acreditaram em mim quando nem eu mesmo estava mais acreditando”, relata com gratidão.
O zelo ao paciente assistido, à história de cada indivíduo, é um dos cuidados da equipe multiprofissional da Rede de Atenção Psicossocial. “Apesar de ser uma doença, enxergamos a dependência química também como um sintoma: o reflexo de uma longa trajetória pessoal. Às vezes, ela surge por um histórico inteiro de abusos, negligências… No começo, a droga é tida como um remédio; mas logo passa a ser a causa de todo o tipo de prejuízo”, argumenta Bandeira.
Rede de atendimento
A SES-DF oferece um amplo atendimento aos pacientes que sofrem com dependência de álcool e drogas. Nas unidades básicas de saúde (UBSs), é possível encontrar acompanhamento de profissionais da Estratégia Saúde da Família (ESF), como médicos, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, farmacêuticos, dentre outros especialistas, para acompanhamento de enfermidades que possam ter sido desenvolvidas em decorrência do abuso dessas substâncias.
Para a coordenadora de Atenção Primária à Saúde (APS), Sandra Araújo de França, as UBSs são um ambiente seguro e confiável para buscar auxílio. “Com a garantia de máxima confidencialidade, as unidades oferecem um espaço para estratégias personalizadas, integrando a gestão do álcool e contribuindo na construção de comunidades mais saudáveis e resilientes”, explica.
Caso seja identificada a necessidade de tratamento mais intenso, é realizado o encaminhamento a um Caps AD, que atende jovens a partir de 16 anos. Brasília conta com sete dessas unidades, sendo duas com funcionamento 24 horas, incluindo fins de semana e feriados, localizadas em Ceilândia e no Setor Comercial Sul. As demais, com atendimentos diários, ficam no Guará, Santa Maria, Sobradinho, Itapoã e Samambaia.
*Com informações da SES-DF