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Sílvia Waiãpi coloca Marina Silva no seu devido lugar

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Sílvia Waiãpi encurralou Marina Silva na CPI das Ongs

RAY CUNHA

Se submetermos a um raio X a bancada da Amazônia no Congresso Nacional veremos que a esmagadora maioria é silenciosa, cuida dos seus negócios, ou é comunista. Assim é no Amapá. Mas saiu justamente de lá uma das deputadas mais extraordinárias desta legislatura: Sílvia Waiãpi, do PL.

Conheci-a pessoalmente há um mês. Quando cheguei ao seu gabinete ela estava no Senado. Como demorasse, fui convidado a ir ao encontro dela. Encontramo-nos, ela pegou no meu braço e foi conversando comigo até o Anexo IV da Câmara, onde fica seu gabinete. Chegando lá, batemos papo durante bastante tempo.

Sou também de Macapá/AP, como Sílvia Waiãpi, e conheço a Amazônia real, pois trabalhei nos maiores jornais da Hileia, daí termos muito a conversar. Mas procurei-a para lhe pedir apoio para uma sessão de autógrafos na Câmara do meu romance ensaístico JAMBU.

Sílvia Waiãpi é uma celebridade. É conhecida nacionalmente e agora começou a se tornar uma personalidade internacional. Recentemente, na Comissão Parlamentar de Inquérito das Ongs, presidida pelo senador Plínio Valério (PSDB/AM), um dos mais valorosos congressistas da Amazônia, e com quem trabalhei no jornal A Crítica, de Manaus, Sílvia Waiãpi colocou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, no seu devido lugar: os subterrâneos das cidades da Amazônia.

– Avise à Europa, ministra, a todos os países no mundo, que eu faço cocô na água porque eu não tenho saneamento, sabe? Por que eu não tenho saneamento? Porque nos foi imputado que nós temos que manter a nossa cultura. Enquanto a senhora vai ao banheiro fazer suas necessidades – disse a deputada, que é indígena.

E deu um exemplo: o Instituto Iepé, ONG que atua junto a comunidades indígenas na Região Amazônica, “recebe dinheiro das embaixadas da França e Noruega, da Comissão Europeia, da Agência Francesa de Desenvolvimento, da Fundação Ford, da Nature Conservancy, da Rainforest Foundation, da Fundação Gordon & Betty Moore, do Internews, Fundo Lira, do GLA (Green Livelihood Alliance), da Nature Conservancy, Talmapais Trust e outras organizações estrangeiras. A mesma ONG que impede os waiãpi de terem energia elétrica em sua comunidade”.

E apresentou um depoimento gravado em vídeo de uma índia waiãpi reclamando que o Iepé “não quer energia elétrica nem internet” na comunidade. A indígena do vídeo, que estava grávida, acabou perdendo seu bebê devido ao atendimento precário que recebe, por falta de energia elétrica.

– O Instituto Iepé, em conluio com agentes públicos, impede o desenvolvimento socioeconômico dos waiãpi a pretexto de uma pretensa “preservação cultural” – afirmou Sílvia Waiãpi. – Todos os funcionários do Iepé residem em cidades como São Paulo, onde têm acesso aos confortos e aos planos de saúde negados ao povo waiãpi.

Sílvia disse que a Fundação Ford financia viagens internacionais a líderes indígenas para criticarem o agro brasileiro em fóruns internacionais e nacionais. Por que? Respondo: porque os países hegemônicos não querem que os povos amazônicos saiam da sua dependência colonial e assim possam sugar até o tutano da Amazônia, incluindo aí crianças para escravidão sexual e retirada de órgãos.

Plínio Valério observou que o Judiciário não deixa que se realizem obras de saneamento básico e infraestrutura na Amazônia alegando que são sítios arqueológicos, para futuramente explorarem os minerais da região.

– As ONGs só têm esse poder porque estão aliadas a partes do Judiciário. Tem sempre um desembargador, um ministro, um juiz pra conceder uma liminar pra qualquer ONG, se encontrar um caco de cerâmica, existente ou “plantado” na região, e paralisa os trabalhos. Isso está ocorrendo, por exemplo, em regiões da Amazônia ricas em potássio – disse Plínio Valério.

Em entrevista a este repórter, em 2008, o deputado federal Nilson Pinto (PSDB/PA), doutor em geofísica, ex-reitor da Universidade Federal do Pará (UFPA), afirmou: “A Hidrovia do Marajó é uma obra de infraestrutura fundamental para o estado do Pará, promovendo a ligação mais eficiente entre Belém e Macapá, passando pelo centro da ilha do Marajó e economizando horas de viagem. Essa obra, que é simplíssima, enfrenta percalços por falta de conhecimento, pelo excesso de zelo gerado pelo desconhecimento de algumas autoridades. O Ministério Público entende que a obra criaria problemas ambientais e tem procurado impedir de todas as formas que seja realizada, e tem conseguido isso, até agora. Há excesso de zelo de um lado e desconhecimento de causa por outro lado. Tem-se apenas de construir um canal de 32 quilômetros, numa região plana, desabitada, sem, absolutamente, nenhum tipo de problema que possa surgir com a construção do canal. A obra se resume, praticamente, na construção do canal.

“Para quem acha que isso é algo portentoso e agressivo ao meio ambiente, eu recomendo que faça uma visita, in loco, ou pela internet, ao canal Reno-Danúbio, na Alemanha, concluído há várias décadas e que liga a bacia do rio Reno à bacia do rio Danúbio. O Reno deságua no Mar do Norte. O rio Danúbio deságua no Mar Negro. Assim, os alemães ligaram o Mar do Norte ao Mar Negro. Trata-se de um canal de 171 quilômetros de extensão, com 66 eclusas, com desníveis fantásticos, tudo em plena operação, no coração da Alemanha, avançando por terras que têm toda uma história pretérita, que vem do tempo do Império Romano, passando por preciosidades arqueológicas e pelo coração de um país que tem um amor pela questão ambiental fantástico. A obra foi feita no meio da Alemanha e não gerou absolutamente nenhuma reclamação, no país que mais cuida do meio ambiente no mundo.

“Para fazer uma obra cinco vezes menor, de impacto ambiental mil vezes menor, na ilha do Marajó, nós temos um problema terrível com o Ministério Público. Eu não acredito que seja por conhecimento de causa, o que mostraria que essa obra não causará praticamente nenhum impacto ambiental. Acredito, sim, que é desconhecimento de quem acha que vai preservar a Amazônia impedindo que as pessoas que nela moram de ter melhores condições de sobrevivência. É um enorme equívoco do Ministério Público, que não tem competência técnica para opinar e está exorbitando da sua função. Deveriam se basear nos trabalhos dos órgãos técnicos competentes nessa área e não emitir pareceres apenas para defender uma posição aparentemente de defesa da Amazônia, do meio ambiente, mas que, na verdade, é uma posição absolutamente retrógrada, que nada tem a ver com desenvolvimento sustentável.

“O Ministério Público se arvora o direito de defender uma causa que não é de ninguém, mas causa de um ou outro visionário que resolveu fazer de uma questão pequena algo grandioso, não sei com que finalidade. O caso está na Justiça, que tem de se basear naquilo que é correto do ponto de vista do aproveitamento das nossas hidrovias, dos rios, que são as vias naturais que temos para deslocamento na Amazônia; tem que se basear na verdade extraída da competência técnica das instituições amazônicas, para poder dar a decisão. Não podemos ficar com uma visão unilateral emperrando o desenvolvimento da região, a melhoria da qualidade de vida da população. O Ministério Público precisa se reciclar. A minha sugestão é que o pessoal do Ministério Público estude mais. Não basta trabalhar com a visão ideológica. Aliás, o Ministério Público não existe para trabalhar com visão ideológica. Ele tem de trabalhar pelo interesse da sociedade, dentro da visão legal.

“Há um claro exagero por parte dos ambientalistas. É necessário para qualquer obra importante, em qualquer lugar e, principalmente, na Amazônia, que se tomem os cuidados para se evitar impactos ambientais de porte. Isso é necessário e existe conhecimento técnico em várias instâncias, neste país, para assessorar a realização de uma obra sempre que isso é necessário. O que nós não podemos aceitar é a visão da redoma. Somos frontalmente contra a visão preservacionista que vê apenas a floresta e esquece as pessoas que moram na floresta, uma posição absolutamente atrasada” – argumentou Nilson Pinto.

Segundo o marajoara ex-senador Mário Couto (PSDB/PA), “o Ministério Público Federal já recebeu mais de 50 quilos de documentos da parte do governo do Pará, mostrando que os impactos ambientais da hidrovia serão mínimos, comparados aos impactos positivos que ela proporcionará; as medidas mitigadoras e ações compensatórias, já detalhadas em farta documentação, superam qualquer dano que a obra possa causar”.

O projeto da Hidrovia do Marajó é fruto de convênio celebrado entre os governos estadual e federal, com contrapartida de 50%. Segundo relatório da Administração das Hidrovias da Amazônia Oriental (Ahimor), “já foram realizados todos os estudos técnicos e ambientais (EIA/Rima) para a dragagem de 32 quilômetros do canal destinado a perenizar a interligação das bacias dos rios Atuá e Anajás, interligação já existente pela própria natureza, mas durante somente seis meses de cheia”.

A construção da hidrovia consiste na dragagem de 9 milhões de metros cúbicos de sedimentos entre os rios Atuá e Anajás, a fim de garantir a navegação na época da seca, de comboios com até 2.800 toneladas de capacidade de carga em quatro chatas, de Belém a Macapá, vice-versa. Segundo o projeto, a hidrovia atravessará pelo meio o arquipélago no sentido sudeste-noroeste, levando novas oportunidades de emprego e de renda para a população local e facilitando o escoamento da produção de todo o Marajó. Os 580 quilômetros que hoje separam Belém de Macapá, porque a ilha do Marajó tem de ser contornada, diminuirão para 432 quilômetros pelo meio da ilha. Haverá uma redução de 148 quilômetros entre a capital do Pará e a capital do Amapá.

A proximidade da hidrovia com o porto de Santana, na zona metropolitana de Macapá, possibilitará que produtos paraenses, como, por exemplo, açaí, piramutaba, cerâmica de Icoaraci e minérios cheguem aos Estados Unidos, Europa e Japão com redução de custo.

“Além disso, a obra vai permitir acesso aos diversos recursos naturais da região marajoara, modernização do seu parque agropecuário e suprimento dos mercados consumidores de Belém e Macapá, viabilizando a criação de bacias leiteiras e estimulando a piscicultura” – observa ainda o relatório da Ahimor, alinhando. A hicrovia desenvolverá o turismo flúvio-ecológico e a integração nacional do Marajó e do Amapá, por meio da Hidrovia Araguaia-Tocantins, outra obra da maior importância para a Amazônia.

A Secretaria Executiva de Transportes do Pará e a Ahimor cumpriram todas as exigências legais, tais como elaboração de EIA/Rima e realização de audiências públicas. Em setembro de 1998, a Secretaria Executiva de Ciência, Tecnologia e Meio-Ambiente do Pará concedeu a licença ambiental para instalação da obra, que foi renovada anualmente, até 2002. Acontece que, por força da ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal, até hoje o projeto da hidrovia não conseguiu sair do papel e a consequência disso é que a população do Marajó sofre os efeitos devastadores de doenças infectocontagiosas, principalmente malária, de erradicação remota diante da dificuldade de ações necessárias para debelar a doença.

O governo do estado e o Ministério dos Transportes chegaram a tomar todas as providências para o início das obras, inclusive a avaliação das terras localizadas nos municípios de Anajás e Muaná, feita por técnicos do Instituto de Terras do Pará (Iterpa). Procuradores do estado foram ao encontro dos comunitários para fazer o pagamento das indenizações no próprio local. Um convênio para distribuição do material lenhoso também foi celebrado com as prefeituras de Anajás e Muaná. Além disso, um plano de saúde foi elaborado para atender a área de influência da futura hidrovia. O plano envolve a construção de ambulatórios, proteção aos operários que trabalharão na obra e imunização contra doenças endêmicas. O fato é que está tudo pronto para que a obra seja realizada. Só depende do Ministério Público Federal.

Mas a Hidrovia do Marajó sairá do papel se os parlamentares do Pará e do Amapá no Congresso Nacional e nas assembleias legislativas dos dois estados quiserem. No Congresso Nacional, quando uma bancada se une em torno de um projeto, pode qualquer coisa. Nem Alexandre de Moraes, nem os 11 supremos barram.

Plínio Valério exibiu vídeos que mostram a dificuldade dos índios koripako para receber o Bolsa-Família em São Gabriel da Cachoeira/AM. Esles têm que se deslocar por até seis dias em canoas para receber o dinheiro. Isso poderia ser resolvido com a abertura de uma estrada de 16 quilômetros. Mas a ONG Instituto Socioambiental (ISA) não quer a construção da estrada.

– O ISA com a Foirn (Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro) não deixam, alegando que não fazem parte da cultura indígena as estradas, as rodovias. O que faz parte da cultura indígena, segundo essa gente, é sofrer, é passar por essas cachoeiras perigosas com o maior problema. Não teria nenhum impacto ambiental uma estrada de 16 quilômetros no meio de tanta floresta… Não teria nenhum impacto ambiental, mas teria um impacto social muito grande, seria o resgate da dignidade – disse.

E quando os koripak chegam a São Gabriel da Cachoeira, muitas vezes dormem ao relento, aguardando o Bolsa-Família.

O senador Hamilton Mourão (Republicanos/RS), da CPI das Ongs, também acredita que a algaravia preservacionista esconde “interesses estrangeiros” de olho nas riquezas da Amazônia. Para Sílvia Waiãpi isso é claro como dia de primavera: o financiamento estrangeiro a ONGs instaladas na Hileia não passam de vírus alisando os cabocos.

Sílvia observou que reprimem atividades agrícolas dos índios, mas o narcotráfico atua como se fosse sócio do Estado, “livremente”, na Amazônia. Também, segundo Sílvia Waiãpi, a miséria tem ampliado a prostituição de índias, e até a venda de crianças indígenas ao crime organizado, para ser usadas em tudo o quanto não presta.

E as escolas do povo waiãpi? Não dá nem para imaginar.

– O Instituto Iepé recebe financiamento de poderosas organizações estrangeiras, mas não pode comprar uma impressora para uma escola waiãpi – disse a deputada.

Sílvia Nobre Waiãpi nasceu na tribo waiãpi, em Pedra Branca do Amapari, no interior do Amapá, em 29 de agosto de 1975, filha do cacique Seremeté. Aos quatro anos, Sílvia teve a perna direita transpassada por um pedaço de madeira e foi levada para Macapá, onde foi adotada por uma família. Aos sete anos, começou a estudar. Aos treze, na sua aldeia, deu à luz sua primeira filha, Ydrish, e um ano depois empreendeu uma viagem, sozinha, para o Rio de Janeiro, onde se tornou moradora de rua.

Conheceu um camelô que a ajudou a encontrar um local para morar. Conseguiu trabalho no Círculo do Livro, vendendo livros de porta em porta, e a frequentar escola. Teve outros dois filhos: Tamudjim, aos 15 anos, e Yohanna, aos 17. Casou-se com um militar, sequestrado e assassinado, em 2007.

Em 2010, foi aprovada para o Exército e em 2011 se tornou a primeira mulher indígena incorporada à força, com o posto de tenente, aprovada com uma das melhores pontuações no Centro de Preparação de Oficiais da Reserva (Cpor) do Rio de Janeiro. Na mesma época, Waiãpi fazia pós-graduação em gênero e sexualidade pelo Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Em 2016, passou a ocupar a função de chefe do serviço de medicina física e reabilitação em fisioterapia no Hospital Central do Exército, em Benfica zona norte do Rio.

Começou a frequentar um grupo de atores e a estudar teatro, formando-se em artes cênicas aos 24 anos. Conseguiu emprego na TV Globo como aderecista do departamento de figurino, preparadora de elenco da minissérie A Muralha e pesquisadora de texto na novela Uga Uga, em 2000, estreando como atriz em 2006, interpretando Pena Levinha, na novela Bang Bang, e participando da minissérie A Cura, em 2010, na Globo.

Em 2017, na minissérie Dois Irmãos, inspirada no livro homónimo de Milton Hatoum, viveu o Domingas, uma indígena tirada da sua tribo para trabalhar como doméstica, contracenando com Cauã Reymond, que interpretava os gêmeos Omar e Yaqub.

Waiãpi é também atleta. Em 2003, conseguiu uma bolsa para estudar fisioterapia no Centro Universitário Augusto Motta. Em 24 de abril de 2019, assumiu o posto de secretária de Saúde Indígena, do Ministério da Saúde.

Além de sua defesa intransigente da Amazônia, Sílvia Waiãpi se dedica a duas causas fundamentais para o Amapá: garantia do fornecimento de energia elétrica para o estado, excluindo-se totalmente a possibilidade de apagões e garantindo o desenvolvimento de um parque industrial; e a extração de petróleo na Margem Equatorial.

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