A Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei que prevê a reoneração gradual da folha de pagamento, com término do benefício para as empresas até 2028. No entanto, uma das medidas mais polêmicas do projeto é a autorização para o governo se apropriar de valores esquecidos em contas bancárias inativas e precatórios não sacados.
Segundo Guilherme Di Ferreira, pós-graduando em Direito Tributário Aplicado pela BSSP, diretor adjunto da Comissão de Direito Tributário da OAB/GO, responsável pela área Tributária no Lara Martins Advogados, a medida fere diretamente o direito à propriedade privada garantido pela Constituição Federal. “Essa apropriação de valores sem o devido aviso ou notificação adequada viola o artigo 5º da nossa Constituição, que assegura o direito de posse dos bens privados”, explica o advogado.
Di Ferreira destaca que as formas de notificação são cruciais para garantir o respeito aos direitos dos cidadãos. “O ideal seria que a notificação fosse feita por correspondência com comprovação de recebimento ou por meio de aplicativos bancários. Apenas em último caso o Diário Oficial deveria ser utilizado, pois essa forma de comunicação não atinge diretamente o público interessado”, conclui o especialista.
Ranieri Genari, advogado especialista em Direito Tributário pelo IBET, membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/Ribeirão Preto, consultor tributário na Evoinc, destaca que a proposta pode criar distorções no equilíbrio fiscal. “A própria autoridade monetária precisou alertar ao Governo e aos deputados que da forma como o texto do PL 1847/2024 estava, em outras palavras, seria o mesmo que forçar o Banco Central a promover, de forma artificial, registros de superávit primário”, afirma.
Além disso, Genari aponta um problema jurídico relacionado à inversão de papéis entre devedores e credores. “Ao permitir que o governo se aproprie de precatórios não sacados, a medida desrespeita uma decisão judicial que determinou o pagamento desses valores, sem mencionar o destino caso o credor não o reivindique”, explica o advogado. Isso, segundo ele, gera uma contradição no sistema jurídico que poderá ser alvo de contestação.
Apesar das críticas, Genari acredita que a judicialização da medida é pouco provável, pois não há flagrante inconstitucionalidade. “Ainda que a medida apresente questões morais e seja vista como um contorno às metas fiscais, não vejo grande chance de judicialização, especialmente após as correções feitas no texto pelo Banco Central”, conclui.